Orgulhoso e inútil, e até mesmo prejudicial, será o doutrinador que se julgar capaz de doutrinar por si mesmo. Sua eficiência depende sempre de sua humildade, que lhe permite compreender a necessidade de ser auxiliado pelos Espíritos bons. O doutrinador que não compreende esse princípio precisa de doutrinação e esclarecimento para alijar de seu espírito a vaidade e a pretensão. Só pode realmente doutrinar Espíritos quem tiver amor e humildade.
Mas é importante não confundirmos humildade com atitudes piegas, com melosidade. Muitas vezes a doutrinação exige atitudes enérgicas, não ofensivas ou agressivas, mas firmes e imperiosas. É o momento em que o doutrinador, firmado em sua humildade natural – decorrente da consciência que tem das suas limitações humanas – trata o obsessor com autoridade moral, a única autoridade que podemos ter sobre os Espíritos inferiores. Esses Espíritos sentem a nossa autoridade e se submetem a ela, em virtude da força moral de que dispusermos. Essa autoridade só a conseguimos por meio de uma vivência digna no mundo, sendo sempre corretos em nossas intenções e em nossos atos, em todos os sentidos. As nossas falhas morais não combatidas, não controladas, diminuem a nossa autoridade sobre os obsessores. Isso nos mostra o que é a moral: poder espiritual que nasce da retidão do espírito. Não se trata da moral convencional, das regras da moral social, mas da moral individual, íntima e profunda, que realiza a integração espiritual do ser voltado para o bem e a verdade.
Mas essa integração não se consegue com sistemas ou processos artificiais, com reformas íntimas impostas de fora para dentro como geralmente se pensa. Existe a moral exógena, que nos é imposta de fora pelas conveniências da convivência humana. Essa moral exógena, pelo simples fato de se fundar em interesses imediatos do homem e não do ser é a casa construída na areia segundo a parábola evangélica. A moral de que necessitamos é endógena, vem de dentro para fora, brota da compreensão real e profunda no sentimento da vida. É a moral espontânea, determinada por uma consciência esclarecida que não se rende aos interesses imediatistas da vida social.
A doutrinação praticada com plena consciência desses princípios atinge o obsessor, o obsedado, os assistentes encarnados e desencarnados e particularmente o próprio doutrinador, que se doutrina doutrinando os outros. Note-se a importância e o alcance de uma doutrinação assim praticada. É ela a alavanca com que podemos deslocar a mente do charco de pensamentos e sentimentos inferiores, egoístas e maldosos em que se afundou. É, por isso mesmo, a alavanca com a qual podemos mover o mundo, como queria Arquimedes, para colocá-lo na órbita do Espírito. Podemos usar essa alavanca em todos os instantes: no silêncio da nossa mente, na atividade incessante do nosso pensamento, na conversação séria ou até mesmo fútil, nas relações com o próximo, nas discussões dos mais variados problemas, na exposição dos princípios doutrinários aos que desejam ouvir-nos, numa carta, num bilhete, numa saudação social – mas sempre com discrição, sem insistências perturbadoras, sem carranca e seriedade formal. O primeiro sintoma da nossa compreensão desse problema é a alegria que nos ilumina por dentro e se irradia ao nosso redor, contagiando os outros. Porque a vida é uma bênção e portanto é alegria e não tristeza, jovialidade e não carrancismo.
Do livro “Obsessão, o passe, a doutrinação”
J. Herculano Pires - Editora Paidéia
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